terça-feira, 16 de novembro de 2010

A dúvida no compasso de espera


Nos últimos dias tenho ouvido bastante Mozart. Sua música é muito complexa, não somente para aqueles que já estudaram sua linha melódica e harmonia intrincadas, mas também para os que somente sentem a emoção transbordando de cada acorde. Considero suas sinfonias especialmente belas, pois parecem ter vida própria. Começam misteriosas, como se quisessem nos fazer crer no insondável, nos atraem, como numa armadilha, e caímos em suas teias sedutoras. Assim, como numa de suas sinfonias, em minha mente surge um mistério, uma dúvida. Contraditoriamente aos princípios da racionalidade, as únicas certezas que tenho estão contidas no coração. Pouco a pouco, a dúvida toma conta de cada mínimo canto da mente e transborda à beira da insanidade sentimental.
Então, como numa revelação, não da Verdade, suprema e inalcansável, mas de algo, que a nós, tolos, soa como grandioso, as notas da música de Mozart explodem numa euforia e agonia semelhantes àquelas das paixões mais arrebatadoras. Acabei descobrindo algo que já havia notado, mas em que eu não desejava crer. Estranhos são os caminhos de nossa mente, que nos ilude para que sintamos mais prazer naquilo que, na realidade, nos traria sofrimento. Mesmo assim, mesmo consciente desse fato, a resposta não vem. A resolução depende de muitos fatores e, essencialmente, do futuro. Passo a me torturar, mais e mais, pois desejo saber o que virá e esse desejo tem o único objetivo de me preservar do sofrimento.
O que mais me atrai na música de Mozart é a constante sensação de suspense. Ele conseguiu, em cada uma de suas composições, imbuir um desejo de mais. Os compassos de pausa estão habilidosamente postos, de tal modo que ansiamos por continuar ouvindo tal coisa magnífica. E a dúvida continuou a me angustiar, pois não detenho qualquer meio para fazer findar o suspense. O risco! A vida é sempre permeada por dúvidas inúmeras e nossas escolhas podem nos conduzir à dor ou ao prazer. Os acordes, apressados, exigem que tomemos uma decisão: sim ou não.
Como o som do trovão que  procede o relâmpago, assim segue, previsível a melodia. No entanto, quando menos se espera, uma guinada, não brusca, mas uma transformação, inesperada e, contudo, harmoniosa, transforma as notas graves e pesadas em sons mais agudos e leves: a paz que surge do mais singelo sorriso. Assim surgiu a escolha. Tememos, sim, por aquilo que pode resultar de nossos atos, mas o risco é a constante da vida. Tomei uma decisão.
A música cresce novamente. Geralmente, nesse ponto, ele sabiamente acrescenta a participação de cada um dos instrumentos e algo até então desconhecido, mas vivo e imponente, se levanta das águas do mistério, da paixão e da paz, todas unidas num só mar. Talvez tenha chegado também o tempo de poupar a mim, acima de qualquer outro, para que também eu possa continuar feliz e, quiçá, possa até mesmo compartilhar essa felicidade com aqueles que realmente merecem. Como um turbilhão, um êxtase, assim eu ouço as notas dessa parte da sinfonia, ela é estarrecedora e magnífica, pois traz, do meio da incerteza e do medo, a concretização. Desse modo, esplêndida, harmoniosa e inigualável, termina a música.
Não é mesmo uma bela composição?

Max

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