domingo, 11 de setembro de 2011

Sê leal ao caos e tolera a ordem.

A desordem e o acaso característicos das situações imprevistas são mais naturais que a ordem sobre a qual acreditamos viver. É conveniente acreditar no domínio absoluto da ordem, pois isso tornaria tudo, inclusive as pessoas, completamente previsível. Uma vez disse que toda aceitação implica algum tipo de dor. Frustrações são difíceis de aceitar, mas, querendo ou não, chegará um momento em que teremos de encará-las. A intensidade da dor vai depender de quanto tempo demoramos em aceitar.
Esses dias minha tolerância foi posta à prova. Felizmente, fracassei. Digo felizmente porque esse fracasso me fez aprender muito. Não percebi o quanto estava sendo irracional e o quanto estava desejando tomar o livre arbítrio dos outros: aprendi que nenhuma expectativa nossa nos dá direitos sobre a liberdade dos outros. Então eu entendi que a intolerância é justamente a não aceitação do rompimento dos outros com as expectativas que fantasiamos sobre eles. Antes de pensar nisso, confesso, eu me achava extremamente tolerante, mas agora, fui obrigado a rever alguns conceitos...
Não existe gosto pior que o da falta de liberdade. Esperar demais dos outros é querer fazer com que eles experimentem desse fel, é perder a noção de onde terminam nossos direitos e onde começam os deles. A pergunta que surge quase que como consequência disso é: quanto se deve esperar de alguém? Não serei hipócrita dizendo que ninguém deveria esperar nada de ninguém, pois não haveria nenhuma ordem se todos se comportassem sem nunca levar em consideração o que os outros indivíduos esperam. Acreditar nisso é acreditar no reino do caos absoluto, tão falso quanto o da ordem absoluta.
Para viver é necessário tomar para si algumas responsabilidades. O caos não deve ser preocupação de uma única pessoa, mas responsabilidade de todas. Nesses dias também pude ver mostras de respeito e de honra, valores que se sobrepõe aos desejos mais irracionais. Nossas responsabilidades vão além das obrigações para com os outros, elas são consequências dos compromissos que assumimos com nós mesmos. Não há verdade absoluta, a verdade é senão aquela com a qual compactuamos, aquela sobre a qual fundamos nossos ideais. Quando assumimos o compromisso com a nossa própria ordem, com a parte que nos cabe no controle do caos do mundo, transcendemos o conceito restrito de fidelidade e atingimos a amplidão do significado real de lealdade.
Esse significado, que costuma passar despercebido pela palavra, talvez seja muito mais importante que qualquer outro sinônimo que lhe é dado. A aceitação de nossa própria verdade e o consequente compromisso com a razão sobreposta aos desejos pode ser o único tipo de aceitação não dolorosa. Quando se assume o pacto da lealdade, não há frustração, pois toda expectativa está em consonância com aquilo que pode nos ser ofertado pelo outro: limites estabelecidos inconscientemente dentro de cada relação, da mais próxima e profunda até a mais distante e superficial.
A lealdade é princípio e fim de muitas outras coisas importantes. Não há amizade fraterna, amor verdadeiro ou mesmo cortesia sincera sem a real lealdade. Pode haver pedras pelo caminho, situações em que nossa verdade não é compartilhada pelo outro, situações em que temos de ser pessoas ou fazer coisas que não parecem nos valer à pena. Nossa lealdade é posta à prova nessas situações, pois é a tolerância que nos fará prosseguir, contornando as maiores dificuldades. A permissividade nos tornaria fracos e submissos, mas a força provém da lealdade e a humildade, da tolerância.
Talvez os egípcios estivessem certos ao dizer que o caos e a ordem estão sempre em luta, mas eu prefiro crer que ambos são rei e rainha, governando gloriosos através da tolerância e da lealdade. Somos o exército desse reino, o reino do equilíbrio, o reino oculto em que os brados cantam a frase do filme de Robin de Hood:

“Lutem, e lutem novamente, até cordeiros se tornarem leões.”

Max