domingo, 22 de janeiro de 2012

O que eu aprendi jogando Paciência Spider


Quando começamos, pra aprender as regras, jogamos no nível fácil, com cartas de um naipe só: nossa família. Tudo parece muito simples e lógico porque as cartas, por mais que apareçam muitas vezes e acabem compondo grupos diferentes, são sempre as mesmas. Um dos maiores problemas que podemos enfrentar é fazer movimentos desnecessários no nível em que estamos jogando em situações em que as cartas da mesa já estão acabando, pois podemos ficar com a mão vazia e um jogo perdido (como quando tentamos subir na cadeira pra pegar aquela coisa brilhante no alto da prateleira sem a supervisão de um adulto, é claro).
Essa fase sem dúvida vai significar muito, vamos ter a impressão de que aprendemos tudo o que precisamos saber para enfrentar o próximo nível. O letreiro de dizendo “Você venceu!” vai aparecer bem rápido e é bem provável que, mesmo cheios de orgulho, não possamos compreender como aquilo pode ser banal para as pessoas a nossa volta. A pontuação final, claro, vai ser alta, afinal, com cartas de um único naipe, você nunca vai conseguir fazer jogadas que tirem pontos: elas serão proibidas. O curioso é que quando estivermos travados em algum jogo em qualquer nível adiante desse, certamente ao menos uma vez nos pegaremos pensando “Puxa... devia ter aproveitado melhor aquela fase, tudo era tão mais fácil!”.
Bem, depois de algum tempo no fácil vamos cansar dessa coisa tão repetitiva e vamos querer algum tipo novo de diversão. Passar para o nível intermediário e acrescentar um novo naipe vai ser bem interessante. O novo naipe vai se chamar “escola”. Alguns vão chorar na porta, nas primeiras vezes, e vão querer voltar para o nível fácil, mas mesmo assim vão insistir para que a gente fique jogando por ali e para isso vão até apelar para o nosso orgulho com o clássico “Você já está grandinho pra isso!”.
Na escola, com o novo naipe, aparecem mais cartas, de uma cor diferente daquela com a qual estávamos acostumados a jogar e, surpresos, vamos perceber que no mundo fora de casa há bem mais jogadas impossíveis além de uma infinidade de combinações. Mesmo assim, uma das regras mais básicas permanece: há uma ordem certa para as coisas e a hierarquia continua valendo na vida de tal forma que você não pode querer colocar o quatro embaixo do dois ou o valete em cima do rei, afinal, o quarto ano nunca vai querer se misturar com o segundo e a diretora sempre vai ser mais poderosa que a professora.
Conforme os jogos passarem e nós vencermos, mesmo que cheguemos num beco sem saída e tenhamos de começar aquele jogo de novo, será um dos tempos mais fabulosos de nossas vidas. Obviamente, durante todo o tempo, não nos daremos conta de quão maravilhoso é aquele jogo tão diverso e cheio de possibilidades e todo período letivo, lá pelo meio, vamos querer que aquilo termine logo, porque mesmo aqueles alunos dedicados ficam ansiosos pelas férias.
Nesse nível vamos querer que apareçam sempre as mesmas cartas. É bem estranho que, enquanto jogamos, tomemos afinidade por algumas cartas e repulsa por outras, mesmo sabendo que teremos que jogar com todas elas e, no fim, todas elas irão para o mesmo pacote. Depois de alguns jogos bem ou mal sucedidos vamos acabar acreditando que certa carta é a mais necessária do mundo e vamos torcer para conseguir alcançá-la, esteja ela escondida ou fora de nosso alcance por estar rodeada de outras cartas. Apaixonados. Não tem jeito, isso vai ser inevitável assim como a dor da desilusão já que é bem provável que não consigamos alcançar a tão almejada carta nas primeiras tentativas.
Cada um vai lidar com essa fase de um jeito diferente, mas todos, sem exceção vão criar teorias sobre como é melhor e mais fácil vencer. Quando já estivermos bem avançados no intermediário é pouco provável que admitamos que talvez nosso jeito de jogar não seja o melhor. Creio que isso seja o que os psicólogos chamam de “identidade própria”. Vamos nos achar os donos do mundo e certos de que nossa técnica vai nos fazer vencer qualquer jogo, partiremos novamente, dessa vez para o nível difícil, empolgados, certamente, mas não sem carregar remorsos pelo nível que deixamos ou medos pelo não conhecemos do futuro.
“Lá fora” o mundo é diferente, alguns costumam nos dizer. Eles tem razão. Aqui fora aparecem finalmente todos os naipes, combinações absolutamente incontáveis e logo de cara aprendemos que novos métodos precisam ser aprendidos. Vamos sentir saudades da facilidade dos outros níveis e vamos rir de como achávamos que não havia nada mais difícil na vida que equações polinomiais ou citologia.
Jogando paciência spider eu aprendi que sempre vai ter uma oportunidade maravilhosa que você vai deixar passar seja por não enxergar, por não ter humildade para voltar atrás ou por termos a ilusão de que vai dar pra consertar tudo logo mais.
Percebi que a carta mais almejada não é aquela que vai te fazer feliz naquele instante. Em geral, nossa “carta-metade” vai ficar relegada ao esquecimento até que percebamos como fomos estúpidos por deixá-la empilhada sob tantas outras cartas inúteis. Outra coisa importante é que a carta perfeita não existe: nenhuma carta vai fechar o jogo sozinha, você ainda vai precisar fazer inúmeros outros movimentos para vencer.
Não importa quantos jogos joguemos, vamos perceber que não existe uma técnica geral para os jogos, cada batalha é única. Concluí, depois de muitos jogos, que a sorte é relativa, ela pode ajudar agora e não servir pra nada daqui a cinco minutos, por isso, previna-se: faça sua própria sorte e deixe o mínimo nas mãos do acaso.
Uma dica importantíssima é fazer o máximo de movimentos no começo, mesmo que eles pareçam não levar a lugar nenhum e só deixar as coisas mais emaranhadas, lembre-se que no início todas as jogadas podem ser desfeitas e é nesse momento em que, geralmente, percebemos quais são as chances reais de as coisas darem certo ou não.
Quando vencer um jogo, comemore, afinal, não vão ser todos que você vai conseguir vencer e depois de muitas tentativas frustradas, não há nada como reviver aquela sensação infância mesmo que ninguém mais te diga "Parabéns! Você venceu". Aliás, atente para isso: suas vitórias e derrotas pertencem unicamente a você, portanto não fique se gabando demais ou punindo os outros pelas suas escolhas, tenha sempre em mente que por mais importante que pareça, "é só um jogo".
Vamos desistir de muitos jogos e é pouco provável que cheguemos a uma solução na primeira tentativa. Repetir, muito, essa é a ordem. Às vezes repetir as jogadas pode parecer inútil, mas pode ser essa repetição que vai nos surpreender e desembaraçar nosso jogo. Caso você fique sem movimentos, tente desfazer, mas se isso não for mais possível, você sempre tem duas opções: recomeçar esse mesmo jogo ou passar para o próximo. Não se iluda, nenhum dos caminhos é mais digno que o outro, a beleza da vida está em saber qual a hora de passar adiante ou tentar de novo.

Não vou mentir, parar de jogar também é uma opção, mas, sinceramente, por mais bobo que pareça, por mais difíceis que os jogos estejam saindo e por mais que eu acabe passando sempre pro próximo tentando achar um mais fácil, acho que ainda prefiro jogar todos os meus jogos até que seja hora de desligar. Você não?