segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

É pra JÁ!


Dizem por aí que devemos “renovar as esperanças” nessa época do ano, no entanto, isso me parece triste dado que, para a maioria, essas “novas esperanças” morrem quando acabam os excessos de bebida e comida das ceias. Muito me deprime perceber que, nesses dias atípicos, todos queiram libertar-se, realizar-se, enfim, todos queiram permitir-se mesmo que não possuam a menor condição de fazê-lo. Então, naquela noite de festa, agarram-se a uma liberdade, ironicamente, imposta a cada um por si próprio enquanto repete-se, talvez como uma forma de convencer-se, que “Hoje é 'O' dia de ser feliz!”. Em nome dessa falsa liberdade, as pessoas cometem excessos irracionais e fazem questão de anunciar quão magnífica é a sua vida, algo que, curiosamente, não tem coragem de fazer em nenhum outro momento.
Adoro festas, elas são ocasiões criadas justamente para que possamos nos permitir e nos alegrar, contudo, as festas dessa época do ano parecem trazer à tona as mais artificiais emoções: uma alegria que parece brotar dos comerciais excessivamente coloridos e iluminados da televisão, paixões que explodem, belas, como fogos de artifício, mas que, num segundo, se apagam mortas no escuro da noite. Desse modo, devo alertar que não são às festas que faço crítica, mas às razões que as impulsionam. Esses motivos me parecem sinceros, mas, de fato, pouco verdadeiros, já que são tão rapidamente esquecidos
Esse ano foi um ano muito difícil pra mim. Enfrentei desafios mil, porém, estou certo que não haverá maior emoção do que aquela de meu encontro, pessoal e verdadeiro, com a minha Felicidade e o compromisso que firmei com a minha Liberdade. Cada conquista foi emocionante, creio que muito mais emocionante do que qualquer festa da qual eu possa participar na próxima semana. Isso sim, valeu a pena.
Eu tenho o prazer de parabenizar aqueles que amo e que terminaram longas jornadas nesses últimos tempos, jornadas repletas de dificuldades, mas, não menos repletas de alegrias e aprendizados. Sinto-me honrado em poder dizer que estive ao lado desses guerreiros e poder compartilhar de suas histórias, vitórias e mesmo das suas derrotas, que tanto nos ensinam. Com eles comemorei cada passo dado adiante e espero com eles comemorar ainda outros tantos.
Por que devo esperar? Por que devo deixar para amanhã a festa, a gratidão, o perdão, a mudança ou mesmo beijo? Não estou certo se essa ceia é, obrigatoriamente, mais importante que a celebração de cada reencontro com os amigos mais queridos, seja para conversar enquanto se costura, seja tão somente para apreciar um bom chá preto com leite. A paz! Ora! Vamos viver a paz agora! Vamos viver em paz agora! Não há maior motivo para celebrar do que a própria existência!
Não há como expressar a gratidão que sinto por aqueles amados que, da mesma forma, estiveram comigo, me apoiando, me ouvindo, mesmo pensando em mim à distância durante os dias mais difíceis que já vivi. Emocionado, desejo-lhes que recebam, para sempre, todo a atenção, carinho e cuidado que tiveram comigo. Certamente suas palavras e seus gestos não serão jamais apagados do meu coração.
Eu presenciei instantes tão belos, tão ímpares que é difícil imaginar que há algo no mundo que possa ser mais fantástico. Esses dias, disse uma coisa interessante: concedo a mim mesmo, diariamente, o benefício da dúvida. E gostaria de estender essa frase, nesse momento, para o benefício do sonho. Muito mal me faz pensar que há tantas e tantas pessoas que fazer inúmeros planos, sonham, só porque chegou o final do ano e, quando as luzes se apagam, elas levam também o brilho sagrado dos sonhos. Esse brilho que deveria perdurar no tempo além do tempo, que deveria nos servir de incentivo na caminhada por mais difícil que ela possa parecer, ele é a matéria de que se compõem as esperanças e é ele que nós devemos, a cada passo, transmutar em realidade.
Mesmo em festa, possamos nos lembrar das dificuldades que superamos e daquelas que ainda pretendemos superar. Deixar as tristezas para trás não deve ser a obrigação de um único dia, mas de todos. Não obstante, os aprendizados não devem ser esquecidos, a preço de termos que sofrer para reconquistá-los.
Meu maior anseio, para daqui a um segundo, é que não fique devendo em sorrisos, em abraços, em declarações de amor. Será que conseguirei? Não sei, mas a incerteza torna o resultado ainda mais prazeroso. Celebrem comigo! Agora, já! Do fundo do coração, desejo a todos um instante, um agora e uma vida de extrema felicidade! Amo vocês!
Até breve!

Max

sábado, 4 de dezembro de 2010

O bater das asas

– Dedico esse texto a todos os meus leitores, aos meus amigos, a um Tio sábio, a todos os anônimos de bom coração e, acima de tudo, àqueles inconformados que não desistem de sonhar.

Preciso começar explicando a grande diferença que existe entre estar satisfeito e estar conformado. A satisfação é a verdadeira felicidade, é o perceber-se completo por dentro, independente do que exista no exterior. Tal é o poder desse sentimento que cada coisa, por mais insignificante que possa parecer aos olhos dos passantes, se torna, a nosso ver, incrivelmente extraordinária. Assim, transbordando de profunda gratidão, queremos, mais do que qualquer outra coisa, compartilhar esse estado de êxtase com o mundo a nossa volta. Não obstante, podemos ser levados à ilusão de uma falsa felicidade que se mostra na forma do conformismo, nesse estado nada temos para compartilhar além de nossa própria inércia e, portanto, o conformismo é a mais egoísta de todas as “não ações”. Conformar-se paralisa a vida e a vida conformada é outro nome daquela a quem chamam morte.
Outro dia, ouvi a trajetória dos Triunfantes comparada à vida de uma borboleta. Depois de muito refletir, eu percebi que há mais beleza nessa comparação do que olhos nem tão perspicazes como os meus tem a capacidade de notar. Assim, resolvi recontar a história de uma borboleta, para, ao meu modo, compartilhar o que julgo ter aprendido. Tudo começa num ovo, estranho, grudado em algum lugar. Quando chega o tempo, sai de lá um ser esquisito, para muitos humanos, repugnante. Normalmente ele tem cores atrativas e, justamente por isso, é um alvo muito mais fácil para os predadores. Ela, que chamamos lagarta, se locomove devagar, rastejando, sem poder ir muito longe ou sem enxergar muito à frente. O instinto de sobrevivência lhe impõe a fome, insaciável e dominadora.
Quantas vezes, por qualquer que seja o motivo, não somos como a lagarta, rastejando em busca de algo que nunca nos satisfaz? O desejo diminui nossa capacidade de raciocinar e acabamos seguindo, sem rumo, sem dar importância a mais nada além de nós mesmos e aquilo que queremos. Hoje, enquanto passava por uma famosa avenida, vi uma senhora sentada na calçada, suja, descalça, parecendo faminta e, desesperada, ela pedia dinheiro para os que passavam. Veio então uma outra mulher, bem vestida, acompanhada de um casal de crianças, agachou-se para olhar nos olhos daquela pedinte e perguntou qual era o seu nome. Não pude ouvir a resposta, só o que ouvi foi o que disse a mulher em seguida: “Olha, a senhora deve estar com fome, não tenho muito pra lhe dar, mas espero que isso lhe satisfaça um pouco” e, abrindo a bolsa, retirou de lá uma maçã e entregou à senhora na calçada. Essa, por sua vez, sem soltar a maçã, segurou as mãos da mulher entre as suas e disse-lhe, com lágrimas nos olhos “Senhora, muito obrigada! Deus lhe pague!”. A mulher sorriu, apertou as mãos da outra e lançou um olhar amoroso para as crianças que aguardavam ao lado. Levantou-se e continuou andando com as crianças enquanto lhes dizia “A gente tem sempre que dividir com quem não tem...”. A avenida estava presunçosamente enfeitada para o Natal, mas, naqueles instantes, estou certo de que não houve maior beleza do que a da cena que acabo de descrever.
Apesar do desejo das crianças em continuar seu passeio e, talvez, até mesmo em detrimento da pressa, essa mulher parou, simplesmente para tentar compartilhar sua felicidade, oferecendo satisfação, desejando mudar. Nossa lagarta, em algum momento, também se sente satisfeita, então, ela isola-se, imobiliza-se, enclausura-se. Seu casulo é o símbolo do desconhecido, pois ela abdica de tudo o que está ao seu redor, da luz, da segurança, do prazer de só fartar-se de comida, e, tudo isso, sem sequer imaginar o que virá pela frente.
Nós, para os quais a vida de uma borboleta é efêmera, sabemos o que acontece depois: ela adquire asas. Já tive o privilégio de ver, por horas a fio, uma borboleta sair de seu casulo e se preparar para seu primeiro vôo. Ela demora muito para conseguir tirar seu novo corpo dali, em seguida, precisa acostumar-se com a luz, precisa secar-se dos fluidos nos quais estava mergulhada. Só então, depois de muito tempo, ela parte, não somente plena em graça, mas em liberdade, para trazer mais beleza ao mundo, seja pela polinização das flores, seja pelo próprio fato dela existir. Nada mais lhe importa, não porque está cega pelo desejo como estava quando era uma lagarta, mas porque ela tem absolutamente tudo aquilo que sua frágil vida pode lhe oferecer.
Deixar de rastejar cegamente movido pelo desejo, enfrentar o medo e entregar-se ao desconhecido, abdicando da segurança e do prazer, simplesmente por desejar uma mudança, isso é a jornada de cada um de nós. Possamos sonhar, a cada segundo, com o dia em que teremos asas, o dia em que seremos livres. Só assim seremos desejosos de mudança e poderemos criar, através de ações, belezas maiores do que quaisquer enfeites que há no mundo, belezas contidas na essência. Sejamos todos, mesmo que satisfeitos, eternos inconformados.

Max

terça-feira, 30 de novembro de 2010

O girar da chave


Algumas horas atrás me despedi de uma amiga. Não nos conhecíamos quando ela veio. Hoje, no entanto, creio conhecê-la o suficiente para afirmar que ela tem uma alma de viajante, de aventureira, uma certa leveza de espírito própria daqueles que estão sempre buscando o novo. Apesar de ter passado poucos meses por aqui e talvez por sentir-se somente de passagem, pois desde o começo já tinha data certa pra ir, ela não conheceu muitas pessoas nem muitos lugares. Ainda assim, como ambos gostamos muito de conversar, compartilhamos muitas coisas em diálogos agradabilíssimos, sempre descontraídos e despropositados.
Posso dizer que ela acompanhou – provavelmente sem entender muito bem o significado – alguns dos momentos mais incríveis que já vivi e compartilhei com ela muitas das minhas histórias, sempre cheias de detalhes. Tudo isso me fez muito bem, me fez mais feliz. Então, hoje a tarde, ajudei a carregar as coisas dela até o carro que a levaria. Um abraço, um desejo de boa sorte e um pedido pra manter contato. O carro saiu. Fiquei no portão por alguns instantes. Entrei, fechei a porta, girei a chave. Sem alarde, sem rodeios, quase que sem ser notada, ela partira.
Numa fração de segundo, aquela em que girava a chave, tive uma de minhas epifanias. Imaginei o que teria feito se ambos tivéssemos um pouco mais de tempo. Fui além e comecei a pensar em quanto todos nós deixamos de fazer por não termos tempo. Deveríamos dar mais atenção àquilo que realmente importa e empregar a maior parte de nosso tempo nessas coisas. Não obstante, isso parece impossível dada a forma como vivemos e o mundo em que estamos inseridos.
Quando fazemos uma escolha, passamos por uma porta e deixamos todas as outras para trás. Se parássemos nessa ação, tudo estaria bem. Nosso grande erro é, antes de seguirmos adiante, girarmos todas as outras chaves, trancando todas as outras portas de possibilidades, tornando nossa escolha um caminho sem volta. Marisa Monte, em uma de minhas canções favoritas, diz “(...) portas e janelas ficam sempre abertas pra sorte entrar (...)”. Nunca havia compreendido essa “sorte” como hoje a compreendo. A “sorte” não é simplesmente o que chamamos de “boa sorte”, o antônimo do azar, sorte é algo muito mais importante, é sina, fado, destino. É essa sorte que abandonamos quando escolhemos por cerrar as portas e as janelas.
O “Vilarejo” descrito na música é o paraíso, lar da abundância, dos sonhos, “lá o tempo espera” e, por isso, tem-se todo o tempo do mundo, decide-se a hora de ir e vir. É essa tranquilidade, que tanta falta nos faz, que nos dá o privilégio de deixar as portas sempre abertas, destrancadas, como possibilidades eternas. Possamos todos nós ser portadores de chaves, mas que as giremos sempre no sentido de abrir e não trancar. Ninguém é livre a portas trancadas.
  Até breve... quando tivermos mais tempo...

Max

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O fio da vida

- para Satie e sua batyan

Outro dia vi uma colcha de retalhos. Cada pequeno pedaço de tecido costurado parecia encaixar-se perfeitamente em seu lugar, mesmo que os motivos das estampas nada tivessem a ver uns com os outros. Achei aquilo muito bonito e, ao perceber minha admiração, a dona da colcha, minha amiga, disse-me que ela havia sido feita pela sua avó. Tenho a impressão de que os povos de origem oriental, como é o caso da família da minha amiga, tem profundo respeito pelos mais velhos, valorizando o que eles dizem como mandamentos de grande sabedoria. Todos esse fatos me encantaram ainda mais e eu passei a refletir sobre as lições de sabedoria contidas na colcha de retalhos.
Imagino uma senhora, com modos simples e feições amáveis. Ela está sentada defronte a um amontoado de pedaços de pano. Seu objetivo é uní-los, um a um, formando um conjunto harmonioso e belo. Nesse momento não há espaço para reflexões em demasia, pois isso acabaria com a leveza e a inocência próprias do acaso. Assim, ela simplesmente mede os comprimentos de alguns retalhos e logo inicia sua obra. Ligando os pequenos pedaços por uma linha contínua, suas mãos hábeis dão forma ao novo a partir daquilo que há pouco eram sobras. Ela já conhece os segredos dos tecidos e, muito embora não saiba o resultado final, ela sorri satisfeita com seu trabalho.
A vida não está pronta diante de nós. Estamos nos deparando constantemente com grandes tapeçarias. Não podemos revestir nossas paredes com elas, mas ainda assim carregaremos parte delas conosco. Nosso grande desafio, assim como o daquela senhora, é unir essas partes, esses retalhos, costurando-os através de uma linha forte que passe por todos eles. Recordei-me das Moiras, as três irmãs mitológicas que teciam os fios do destino dos homens e deuses. Tal era o poder delas que até mesmo Zeus, o senhor do Olímpo, estava submetido à sua obra. Por maior que seja nosso domínio sobre a vida, podem ser entremeados motivos que não gostaríamos que estivessem lá, mas não poderemos rasgá-los ou arrancá-los da colcha, pois o trabalho seria muito degradado.
Retalhos nada mais são que sobras de pano, são as lembranças daquilo que vivemos e que, seja ou não por nossa espontânea vontade, acabamos por incorporar à nossa vida. A colcha, depois de pronta, tem o propósito de ser acolhedora, envolvente, de acalentar nas horas frias ou proteger da aspreza do mundo a nossa volta, se ela não cumpre esse papel, precisamos ter coragem deixá-la de lado e aguentar o frio, até que tenhamos costurado uma nova peça.
Para mim, o mais interessante na colcha é justamente a consequência de não se pensar demais para costurá-la: não há grandes planos. Sabe-se mais ou menos onde se quer chegar, mas não fazemos idéia de como será o conjunto depois de pronto. A senhora que tece a colcha deve ser mesmo sábia, pois continua seu trabalho, sem ligar para essas coisas, sem se preocupar com a complexidade das cores e motivos, ela só tece. Então, quando a questionamos porque sorri enquanto costura, ela permanece em silêncio, calma, olhando para seu trabalho. Vagarosamente ela repousa as mãos sobre o colo, deixando, por alguns instantes, a linha descansar. Como se despertasse, ela ergue os olhos para seu interlocutor, fita-o com ternura, e responde, quase como um sussurro, mas espontânea e alegre: “É que me lembrei de uma coisa engraçada...”

Max
 

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Flor do deserto


Ontem conversava com uma amiga sobre meu novo aniversário. Realmente as mudanças em mim foram tantas e tão profundas que considero, sem dúvida alguma, que renasci para uma vida nova, uma vida mais feliz e mais plena, enfim, uma vida de liberdade. Decidi que meu novo aniversário será no dia 25 de outubro, pois foi nesse dia que, fechando um curioso ciclo, meu grande espelho caiu da parede e com ele, de certa forma, também caiu a imagem que tinha sobre mim mesmo.
Aprendi muito, com muitas pessoas. Escolhi, no dia de hoje, escrever para uma dessas pessoas, a justa homenagem a alguém que, estando presente desde o princípio, pode trazer à minha vida certa luz sem a qual, talvez, não teria conseguido prosseguir. Espero, sinceramente, que o exemplo que ela foi e é, possa, de algum modo, ser tão significativo para outros quanto o é para mim.
Sei que todos temos motivos para chorar, seja por alegrias ou tristezas, pois o mundo está repleto de desventuras. Não obstante, também sei que as lágrimas que rolaram pelo rosto dessa pessoa, ajudaram-na a compreender que não é razoável perdermos tempo precioso nos questionando sobre os porquês dos acontecimentos, mas, muito mais útil do que isso, é vivenciar cada instante com emoção, encarando os desafios e aproveitando cada um dos pequenos prazeres que o simples fato de estarmos vivos nos proporciona.
Hoje sou capaz de me emocionar com a beleza ímpar de qualquer coisa que esteja a minha volta. Isso, ao contrário do que muitos podem pensar, não é uma forma infantil ou imatura de ver a vida, mas acredito que seja sim o modo mais adulto de encarar as coisas: enxergando, com humildade, todas as verdadeiras qualidades que há em cada mínima parte da Criação. Outro dia, ouvi falar de alguns animais com peculiaridades curiosíssimas e me peguei pensando em como é surpreendente que, das mais aparentes adversidades, consigam sugir não apenas a vida, mas também a força e a graça.
Nada nem ninguém foge dos desígnos da Natureza e, assim como plantas lindíssimas podem florescer nos desertos, também nós podemos crescer esplendorosamente em meio às adversidades. Contudo, se pensarmos que com cada lágrima podemos trazer a vida à aridez de um deserto de desespero, se chorarmos um mar, então poderá brotar uma floresta. E essa pessoa cresceu, sempre e cada vez mais, em meio a desertos de dificuldades, cresceu e se desenvolveu tanto que hoje talvez não acredite no quanto consguiu realizar a partir da areia, talvez sequer consiga crer que a grande beleza que surgiu ao seu redor foi semeada pelo seu abnegado sacrifício.
É difícil encontrarmos alguém, hoje em dia, que consiga verdadeiramente amar. As pessoas deturparam de forma rude o amor e o traduziram como um sentimento vil de dependência e até mesmo uma simplória paixão. Amar é muito mais difícil do que se prega, pois implica na real abdicação, no abandono de tudo, inclusive de si mesmo, em função de outro, aceitando, inclusive, as últimas consequências dessa entrega como a dor ou mesmo a morte. Como costumo sempre citar um grande mago do passado “amar é doar-se aos outros”. E essa não é uma doação que deseja algo em troca, não! Essa doação se faz a partir do momento em que sentimos que nada mais nos é necessário além do próprio fato de podermos servir, real e dignamente, servir em Liberdade.
A virtude dos heróis, dos “semideuses”, dos maiores dentre os homens, é viver a todo instante o Amor. Entretanto, houve poucos heróis na história da humanidade, de tal modo que podemos considerar admiráveis aqueles homens que, mesmo sem querer, aprendem a amar verdadeiramente. A pessoa à qual dedico essa carta possui virtudes inúmeras, mas, certamente, nenhuma delas me ensinou mais do que sua capacidade de viver o Amor em Liberdade nas possibilidades de alguém comum, sem “iluminação espiritual” ou poderes fantásticos, mas simplesmente agindo. Sempre com a chance de escolha em suas mãos, teve discernimento e sabedoria e pode aceitar sua própria felicidade e amar o quanto quisesse. Esse é um de meus maiores exemplos e, sinceramente, espero que ele tenha lhes sido tão tocante como o foi em toda a minha vida.
Muito obrigado por estar sempre comigo, meu grande exemplo! Te amo!

Max

(O texto está sendo republicado, pois, na primeira versão postada, por algum motivo, faltou um parágrafo inteiro, parte essencial do mesmo.)

terça-feira, 16 de novembro de 2010

A dúvida no compasso de espera


Nos últimos dias tenho ouvido bastante Mozart. Sua música é muito complexa, não somente para aqueles que já estudaram sua linha melódica e harmonia intrincadas, mas também para os que somente sentem a emoção transbordando de cada acorde. Considero suas sinfonias especialmente belas, pois parecem ter vida própria. Começam misteriosas, como se quisessem nos fazer crer no insondável, nos atraem, como numa armadilha, e caímos em suas teias sedutoras. Assim, como numa de suas sinfonias, em minha mente surge um mistério, uma dúvida. Contraditoriamente aos princípios da racionalidade, as únicas certezas que tenho estão contidas no coração. Pouco a pouco, a dúvida toma conta de cada mínimo canto da mente e transborda à beira da insanidade sentimental.
Então, como numa revelação, não da Verdade, suprema e inalcansável, mas de algo, que a nós, tolos, soa como grandioso, as notas da música de Mozart explodem numa euforia e agonia semelhantes àquelas das paixões mais arrebatadoras. Acabei descobrindo algo que já havia notado, mas em que eu não desejava crer. Estranhos são os caminhos de nossa mente, que nos ilude para que sintamos mais prazer naquilo que, na realidade, nos traria sofrimento. Mesmo assim, mesmo consciente desse fato, a resposta não vem. A resolução depende de muitos fatores e, essencialmente, do futuro. Passo a me torturar, mais e mais, pois desejo saber o que virá e esse desejo tem o único objetivo de me preservar do sofrimento.
O que mais me atrai na música de Mozart é a constante sensação de suspense. Ele conseguiu, em cada uma de suas composições, imbuir um desejo de mais. Os compassos de pausa estão habilidosamente postos, de tal modo que ansiamos por continuar ouvindo tal coisa magnífica. E a dúvida continuou a me angustiar, pois não detenho qualquer meio para fazer findar o suspense. O risco! A vida é sempre permeada por dúvidas inúmeras e nossas escolhas podem nos conduzir à dor ou ao prazer. Os acordes, apressados, exigem que tomemos uma decisão: sim ou não.
Como o som do trovão que  procede o relâmpago, assim segue, previsível a melodia. No entanto, quando menos se espera, uma guinada, não brusca, mas uma transformação, inesperada e, contudo, harmoniosa, transforma as notas graves e pesadas em sons mais agudos e leves: a paz que surge do mais singelo sorriso. Assim surgiu a escolha. Tememos, sim, por aquilo que pode resultar de nossos atos, mas o risco é a constante da vida. Tomei uma decisão.
A música cresce novamente. Geralmente, nesse ponto, ele sabiamente acrescenta a participação de cada um dos instrumentos e algo até então desconhecido, mas vivo e imponente, se levanta das águas do mistério, da paixão e da paz, todas unidas num só mar. Talvez tenha chegado também o tempo de poupar a mim, acima de qualquer outro, para que também eu possa continuar feliz e, quiçá, possa até mesmo compartilhar essa felicidade com aqueles que realmente merecem. Como um turbilhão, um êxtase, assim eu ouço as notas dessa parte da sinfonia, ela é estarrecedora e magnífica, pois traz, do meio da incerteza e do medo, a concretização. Desse modo, esplêndida, harmoniosa e inigualável, termina a música.
Não é mesmo uma bela composição?

Max